Valvularnaldo
"Atenção, senhores passageiros, favor afivelar os cintos", diz aquela voz anasalada que sai dos alto-falantes do avião. É mais ou menos com esse sistema de som que são amplificadas as vozes e os instrumentos de seus artistas preferidos quando você vai a uma casa de shows, afirma o engenheiro de som Luiz Fernando Cysne. Pelo menos por enquanto.
Antigamente, os alto-falantes usavam um sistema de áudio com válvulas em seu mecanismo, algo que pode ser melhor compreendido nas imagens aos lado. Porém, as válvulas eram grandes, desajeitadas e deixavam as caixas de som domésticas com um tamanho incompatível com os apartamentos, cada vez menores. Assim, popularizou-se o sistema de P.A. - sigla para "public address", um conjunto de amplificadores, mixer e caixa de som - com transistores. Este, com uma estrutura bem menor, porém de qualidade inferior. Pelos menos, esse é o consenso entre os engenheiros de som, diz Cysne.
Audiófilo e com os ouvidos apurados que a profissão exige, Cysne sempre repugnou a dominação do mercado pelos CDs, MP3, e, principalmente, os transistores. Por isso, tudo casou tão bem quando foi procurado por Arnaldo Baptista, ex-Mutantes, músico, e, sem dúvida, uma figura. Arnaldo é outro que quer mudar a forma como o grande público ouve música, especialmente em apresentações ao vivo. Por isso, a dupla desenvolveu um projeto de P.A. que leva ao público a pureza sonora que eles buscam. Arnaldo bateu o pé, no início do ano, e decidiu: "Se for para fazer show com P.A. transistorizado, não faço mais". "Mas Arnaldo", seus produtores tentaram argumentar, "não existe P.A valvulado em lugar nenhum do mundo." Não foi problema para ele, que resolveu convocar Cysne para criar o primeiro "de toda essa Terra", como define.
Cysne e Arnaldo, que têm os verbetes "transistor" e "válvula" recorrentes em seu dialeto, concordam que o passado da válvula a denigre. Antigamente, sua estrutura física sensível, frágil e grande, feita à base de vidro, fez com que ela deixasse de ser de uso padrão. Porém, com a tecnologia atual, elas podem e são fabricadas de forma mais resistente e, ainda, oferecem a vantagem de serem infinitamente melhores, conforme explica Cysne, de maneira bastante fervorosa: "Desde que o transistorizado surgiu, achei horroroso. O som dele, de cara, já me deu vontade de vomitar". Provavelmente, o som de uma casa de shows nunca deu a um frequentador esse mesmo ímpeto físico de mal-estar. Mas ele garante que qualquer ouvido leigo sentiria a diferença de ir a um show em que tudo que sai das caixas de som passou por válvulas, e não pelo transistor. Sendo assim, compartilha do sonho de Arnaldo.
Voltando à voz anasalada que nos instrui sobre a segurança da aeronave: "Ouvi falar de uma história que uma fábrica, no passado, sugeriu que passasse a ser usado transistorizado/digital nos aviões, por ele ser menos frágil. Isso foi aceito. E aí, como era mais prático, todo mundo aderiu e o público foi deixado ao relento, com um som de vidro quebrado", explica Arnaldo, a respeito da popularização do sistema de áudio mais comum atualmente. O paralelo traçado para se compreender é com a relação entre os frágeis, grandes, e difíceis de manipular vinis e os inicialmente modernos e impecáveis CDs. "Quando veio o primeiro CD, aquilo era tido como o puro estado da tecnologia e da arte, uma tecnologia para sempre. Só que muita gente que trocou toda sua coleção de vinis para CDs se arrependeu", argumenta Cysne.
A dupla corre, então, atrás do prejuízo, da mesma forma como os amantes de música hoje se esforçam para encontrar vinis, gastando fortunas pela internet para importá-los de diversos lugares. Gravando, atualmente, o álbum Esphera, Arnaldo já prepara o espetáculo que levará seu disco ao público. E o transistor não tem lugar nele.
"A gente fala em amplificador valvulado, mas no show, os músicos, só eles, usam amplificadores valvulados de 100 watts. Porém, eles concorrem com o retorno com 10.000 watts, tudo altíssimo, então, o valvulado desaparece. Fica aquela cacofonia de som não-valvulado", comenta Arnaldo, ressaltando que a má qualidade do áudio é compensada pelo volume, para que o som se propague pela casa toda, gerando não só um resultado ruim, mas também alto demais e perigoso para a saúde. "Faz parte do sonho não só valvular o som do artista, em cima do palco, mas sim a casa de shows inteira. Afinal, é um P.A. Em inglês isso quer dizer 'public address', algo como 'endereçado ao público'. É como se eu pedisse um presente para o Papai Noel, o presente que mais me deixa satisfeito. E estou sendo atendido! Eu penso até em chamar de 'Valvularnaldo' ou 'Valvulaldo', alguma coisa assim", brinca.
Fonte: Rolling Stone
Antigamente, os alto-falantes usavam um sistema de áudio com válvulas em seu mecanismo, algo que pode ser melhor compreendido nas imagens aos lado. Porém, as válvulas eram grandes, desajeitadas e deixavam as caixas de som domésticas com um tamanho incompatível com os apartamentos, cada vez menores. Assim, popularizou-se o sistema de P.A. - sigla para "public address", um conjunto de amplificadores, mixer e caixa de som - com transistores. Este, com uma estrutura bem menor, porém de qualidade inferior. Pelos menos, esse é o consenso entre os engenheiros de som, diz Cysne.
Audiófilo e com os ouvidos apurados que a profissão exige, Cysne sempre repugnou a dominação do mercado pelos CDs, MP3, e, principalmente, os transistores. Por isso, tudo casou tão bem quando foi procurado por Arnaldo Baptista, ex-Mutantes, músico, e, sem dúvida, uma figura. Arnaldo é outro que quer mudar a forma como o grande público ouve música, especialmente em apresentações ao vivo. Por isso, a dupla desenvolveu um projeto de P.A. que leva ao público a pureza sonora que eles buscam. Arnaldo bateu o pé, no início do ano, e decidiu: "Se for para fazer show com P.A. transistorizado, não faço mais". "Mas Arnaldo", seus produtores tentaram argumentar, "não existe P.A valvulado em lugar nenhum do mundo." Não foi problema para ele, que resolveu convocar Cysne para criar o primeiro "de toda essa Terra", como define.
Cysne e Arnaldo, que têm os verbetes "transistor" e "válvula" recorrentes em seu dialeto, concordam que o passado da válvula a denigre. Antigamente, sua estrutura física sensível, frágil e grande, feita à base de vidro, fez com que ela deixasse de ser de uso padrão. Porém, com a tecnologia atual, elas podem e são fabricadas de forma mais resistente e, ainda, oferecem a vantagem de serem infinitamente melhores, conforme explica Cysne, de maneira bastante fervorosa: "Desde que o transistorizado surgiu, achei horroroso. O som dele, de cara, já me deu vontade de vomitar". Provavelmente, o som de uma casa de shows nunca deu a um frequentador esse mesmo ímpeto físico de mal-estar. Mas ele garante que qualquer ouvido leigo sentiria a diferença de ir a um show em que tudo que sai das caixas de som passou por válvulas, e não pelo transistor. Sendo assim, compartilha do sonho de Arnaldo.
Voltando à voz anasalada que nos instrui sobre a segurança da aeronave: "Ouvi falar de uma história que uma fábrica, no passado, sugeriu que passasse a ser usado transistorizado/digital nos aviões, por ele ser menos frágil. Isso foi aceito. E aí, como era mais prático, todo mundo aderiu e o público foi deixado ao relento, com um som de vidro quebrado", explica Arnaldo, a respeito da popularização do sistema de áudio mais comum atualmente. O paralelo traçado para se compreender é com a relação entre os frágeis, grandes, e difíceis de manipular vinis e os inicialmente modernos e impecáveis CDs. "Quando veio o primeiro CD, aquilo era tido como o puro estado da tecnologia e da arte, uma tecnologia para sempre. Só que muita gente que trocou toda sua coleção de vinis para CDs se arrependeu", argumenta Cysne.
A dupla corre, então, atrás do prejuízo, da mesma forma como os amantes de música hoje se esforçam para encontrar vinis, gastando fortunas pela internet para importá-los de diversos lugares. Gravando, atualmente, o álbum Esphera, Arnaldo já prepara o espetáculo que levará seu disco ao público. E o transistor não tem lugar nele.
"A gente fala em amplificador valvulado, mas no show, os músicos, só eles, usam amplificadores valvulados de 100 watts. Porém, eles concorrem com o retorno com 10.000 watts, tudo altíssimo, então, o valvulado desaparece. Fica aquela cacofonia de som não-valvulado", comenta Arnaldo, ressaltando que a má qualidade do áudio é compensada pelo volume, para que o som se propague pela casa toda, gerando não só um resultado ruim, mas também alto demais e perigoso para a saúde. "Faz parte do sonho não só valvular o som do artista, em cima do palco, mas sim a casa de shows inteira. Afinal, é um P.A. Em inglês isso quer dizer 'public address', algo como 'endereçado ao público'. É como se eu pedisse um presente para o Papai Noel, o presente que mais me deixa satisfeito. E estou sendo atendido! Eu penso até em chamar de 'Valvularnaldo' ou 'Valvulaldo', alguma coisa assim", brinca.
Fonte: Rolling Stone
Realmente não tem comparação um ampli valvulado com um transistorizado. O valvulado tem um som "gordo", lindo...
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